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Sexta-feira, 29 de março de 2024
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Filipe Luís se derrete por Neymar e Messi e revela metas para 2019: Copa América e menos celular

Figurinha carimbada da seleção brasileira, lateral-esquerdo destaca coração de Neymar, fala da rivalidade e admiração pelo argentino e reafirma desejo de se aposentar no Atlético de Madrid

Desde o fim da Copa do Mundo de 2014, apenas cinco jogadores vestiram a camisa da seleção brasileira mais do que Filipe Luís. O lateral-esquerdo do Atlético de Madrid se tornou figurinha carimbada da equipe dentro de seu estilo discreto e eficiente.

Aos 33 anos, Filipe Luís segue firme neste novo ciclo sob comando de Tite. Foi o titular nos três jogos mais importantes do pós-Copa, contra Estados Unidos, Argentina e Uruguai.

Jogos pela Seleção desde a Copa-2014
Willian: 53
Miranda: 47
Coutinho: 44
Neymar: 42
Fernandinho: 37
Filipe Luís e Alisson: 34
Veterano, Filipe Luís tem trocado planos a longo prazo por metas curtas na Seleção. Nessa entrevista ao GloboEsporte.com, disse “morrer de vontade” de disputar a Copa América no Brasil, em junho, e sonhar com uma trajetória ainda longa de convocações. No Atlético de Madrid é o contrário: seu desejo é um novo contrato longo para poder se aposentar no clube.

"Tenho muita vontade de viver isso, muita mesmo. É momento de o Brasil começar a valorizar a Copa América. É um torneio importante e temos que voltar a ganhar"
Filipe também falou sobre sua relação com Neymar, atração à parte em cada convocação, da “rivalidade e admiração infinitas” por Messi. Do desejo de ser técnico quando parar de jogar, da incômoda lesão que o tirou de ação no fim do ano passado, e até mesmo do gosto por assistir a cirurgias e da eleição de Jair Bolsonaro.

"Quem conhece o Neymar sabe que ele é um cara de coração extraordinário, que ajuda muita gente, pensa muito nos outros. Um ídolo como ele costuma ser mais egoísta."
"Ouvi que Messi não merecia ganhar a Bola de Ouro por que fez uma temporada ruim em 2018. Ou quem fala isso não está vendo o que eu vejo ou eu não sei nada de futebol."
"Para a população apostar na extrema direita é por que com certeza a coisa estava complicada. Eu não sou de extrema, gosto da normalidade, do diálogo."
Metas para 2019? Além da Copa América e do novo contrato, o lateral-esquerdo vai inaugurar um centro de alto rendimento para crianças em Jaraguá do Sul, inspirado em Rafael Nadal, e jura que vai passar menos tempo no celular.

– Vou ver a vida pelos meus olhos e não por uma tela.

Leia a íntegra da entrevista:
GloboEsporte.com: Como você se vê na seleção brasileira, aos 33 anos, às vésperas da Copa América e num ciclo em que o Tite deve, aos poucos, aprofundar uma renovação do grupo?
Filipe Luís: Quando eu tinha 24 anos, a Seleção para mim era uma pressão. Eu achava que tinha de chegar e fazer o melhor jogo e o melhor treino do mundo para voltar na próxima. Hoje eu aproveito cada convocação, vou sem peso. O que me faz voltar é a performance no clube, isso eu demorei muito para aprender. Achava que tinha de chegar e matar um leão todo dia. Mas tenho de estar bem no clube, jogando, disputando títulos, e a Seleção vem naturalmente, e você chega com mais nome, força, peso. Hoje, cada ida é um presente. Estou me divertindo e jogando cada vez melhor na Seleção. No dia em que eu parar vou sentir falta de cada segundo. Pena que demorei para entender.

Mas você não continua matando um leão por treino? Certa vez, Tite disse que o nível de competição que você dava ao treino, mesmo entre os reservas, era importante para ele.
Eu sou assim também no clube, dou o máximo em cada treino. Se não quiserem me colocar de titular, terei a cabeça tranquila por ter feito tudo que estava ao meu alcance. Mas antes eu tentava fazer jogadas diferentes, algo a mais para aparecer. É aí que o jogador de futebol erra muito, tentando fazer mais do que sabe ou deve. Eu, como lateral, acabava subindo mais do que devia, correndo mais, cansando mais e jogando pior. Quando o cara joga sem querer atropelar e coloca o talento a serviço do coletivo, ele realmente deslancha. Eu sempre dou a vida em treinos e jogos, mas esse pensar egoisticamente me fazia errar. Não sou eu que tenho de jogar bem, é o grupo. Se isso acontecer, eu vou jogar bem.

"Antes eu tentava fazer jogadas diferentes, algo a mais para aparecer. É aí que o jogador de futebol erra muito, tentando fazer mais do que sabe ou deve."
E você compartilha essa experiência com jovens que estão chegando agora à Seleção, para que eles não demorem tanto a aprender?
Na Seleção há vários líderes que falam abertamente para todo o grupo. É o caso do Thiago Silva, Neymar, Casemiro, Fernandinho, caras que transmitem essa liderança. Eu não sou tanto de falar para o grupo, mas quando vejo um erro individual eu falo. Não há ninguém com quem eu deixe de falar por ser um ou outro. Se eu acho eu falo, coisas boas ou não tão boas. É difícil falar o que as pessoas precisam ouvir. Eu sempre tento transmitir.

E essas mensagens não tão boas são bem recebidas?
O grupo da Seleção é muito bom, tem muita qualidade e são todos muito receptivos na hora dos conselhos. É fácil trabalhar.

Alguém fez isso com você quando estava começando?
O cara que me acolheu com mais carinho foi o Kaká, em 2009. Eu me sinto muito semelhante a ele na forma de ser e conversar. Fizemos uma boa amizade e me espelhei muito no que ele faz. Aquele grupo de 2009 tinha muitos líderes: Lúcio, Juan, gente com muita experiência. O Dani Alves também falou muito comigo, tivemos muitas batalhas em campo, mas sempre foi um espelho na minha função. Cada geração tem tipos diferentes de homens no grupo, mas sempre há lideranças.

Você citou o Neymar entre os líderes, e a relação de vocês chama atenção. Estão sempre juntos nos treinos, brincando, se desafiando, nas redes sociais também. E são pessoas absolutamente diferentes. Como esse laço se fortaleceu?
Neymar e eu temos uma semelhança: nós somos muito competitivos. Ele não gosta de perder, eu também não. Nos treinos, por ele ser tão leve e driblar tão rápido, o pessoal às vezes tem medo de chegar um pouco mais forte. Eu não (risos). Temos várias brincadeiras. Sou assim no meu dia a dia, a todo momento, em todo lugar. E ele também gosta muito de competir. Essa semelhança fortaleceu nossa amizade, principalmente na Copa do Mundo, quando o cara abre o coração porque sabe que todos estão pelo mesmo objetivo, confiamos 100% nos companheiros e tentamos conhecer melhor o cara do lado. Ele é um cara sensacional.

"Nos treinos, pelo Neymar ser tão leve e driblar tão rápido, o pessoal às vezes tem medo de chegar um pouco mais forte. Eu não (risos)."
Você não é o único que faz elogios ao Neymar. Normalmente, quem convive com ele gosta bastante. Por outro lado, a imagem que o público mais distante tem dele não é tão boa. Por que isso acontece? Como ele poderia mudar isso?
Quem conhece o Neymar sabe que ele é um cara de coração extraordinário, que ajuda muita gente, pensa muito nos outros. Um ídolo como ele costuma ser mais egoísta, mas ele muitas vezes na Seleção já pensou em como fazer para ajudar o pessoal que está trabalhando. Ele se esforça para deixar todo mundo feliz. Está sempre preocupado que os amigos e a família estejam felizes. É uma pessoa de coração bom. Dentro de campo, ele muitas vezes tem um jogo debochado, de dar um chapéu, uma lambreta, uma caneta para trás. Milhares de crianças adoram e copiam, mas milhões de outras pessoas não gostam, acham arrogante, e essa imagem acaba sendo associada à vida pessoal. Mas eu vejo seus atos, o carinho com os fãs. O Cristiano Ronaldo também é considerado antipático pelo que faz em campo e é um cara sensacional. O Neymar sabe muito melhor do que eu o que fazer com sua imagem. Ele vive na fama desde os 15, 16 anos. Quem o conhece gosta muito dele.

Você há pouco falou da Copa do Mundo e deu a impressão de ter sido mesmo uma experiência única de convívio. Foi a coisa mais especial da qual você já participou?
Não há nada igual. Eu vejo todos os troféus que tenho em casa, recortes de jornais, fotos, e não há nada comparado ao que vivi naquele mês e meio, aos dois jogos que joguei (contra Sérvia e México), ao ambiente que vivemos, à excelência do trabalho. São os melhores dos melhores do mundo fazendo qualquer coisa para ganhar. Isso torna os passes precisos, faz com que o pessoal corra mais, que todos tenham que jogar um futebol perfeito. É uma experiência maravilhosa, só tenho pena de ter ido a apenas uma.

Tem esperança de ir ao Catar, em 2022?
Eu gostaria muito, sou positivo, mas agora vivo ano a ano a Seleção. Vou tentar fazer o melhor possível para ir à Copa América deste ano, depois à outra de 2020, esse é meu objetivo. Não coloco como meta ir à Copa do Mundo de 2022, mas sonho continuar muito tempo na Seleção.

Há quem diga que a volta do Marcelo à equipe no seu lugar, contra a Bélgica, tenha sido um dos fatores da eliminação do Brasil. Você concorda?
O Tite sempre explicou minuciosamente suas decisões. Quando ele decide isso, eu com certeza aceito e concordo porque ele vê nosso grupo de maneira melhor do que eu. Eu vejo individualmente, ele vê todos os lados. Com certeza foi certo. É muito fácil falar agora que poderia ter feito algo diferente. Ele foi a pessoa no mundo que mais pensou nessa e em outras decisões. A derrota foi muito dura e continua sendo, mas quando perdi a final da Champions prometi que nunca mais iria chorar por futebol na vida. E não chorei! Na semana passada, o Atlético foi eliminado da Copa do Rei (pelo Girona) e meu filho voltou chorando no carro. Tenho que dar o exemplo e ensinar que é um jogo, nem todos ganham sempre nem perdem sempre. É aprender com os erros e fazer o que o Tite faz, que é ter o maior número de fichas para ganhar. Nem sempre tu vai ganhar, mas quanto mais fichas, maior o número de apostas, o normal é ganhar. Ele faz isso. Depois depende dos jogadores e de muitos outros fatores.

"Quando o Tite decide isso (colocar Marcelo em seu lugar contra a Bélgica), eu com certeza aceito e concordo porque ele vê nosso grupo de maneira melhor do que eu. Eu vejo individualmente, ele vê todos os lados."
Você foi campeão da Copa das Confederações em 2013, no Brasil. Como vê a chance de disputar outro torneio em casa neste ano?
Foi espetacular o que vivemos naquela Copa das Confederações. Eu morro de vontade de jogar a Copa América no Brasil para viver outro momento desse. São estádios e gramados diferentes, culturas diferentes no país, calor, frio, o Brasil mais experiente em grandes eventos. Tenho muita vontade de viver isso, muita mesmo. Que eu possa estar nela e, se Deus quiser, fazer uma grande Copa América e ser campeão na frente da nossa torcida. O Brasil tem de voltar a ser campeão da Copa América. É um torneio muito importante. Talvez o torcedor não valorize, mas outros países sim. É momento de o Brasil começar a valorizar, é nosso torneio continental e temos que voltar a ganhar (o último título da Seleção na Copa América foi em 2007).


Até porque o Brasil precisa retomar o hábito de ganhar, não acha? A Seleção parece cada vez mais pressionada e isso tem interferido no desempenho em jogos decisivos.
Sem dúvida. É preciso se acostumar a ganhar, ser um time vencedor faz um grupo sólido. O Chile fez isso nas Copas Américas anteriores, o erro deles foi até entrar mais relaxado nas eliminatórias. Quando se acostuma a momentos de pressão é mais fácil, as pernas não pesam tanto. O hábito de ganhar títulos é fundamental.

E no Atlético de Madrid, como você se sente? Estava jogando com frequência antes de se machucar, a equipe também vinha conquistado resultados bons.
Meu momento no Atlético era muito bom, talvez o meu melhor momento. Eu me sinto bem em campo, solto e com confiança, foi uma pena minha lesão antes do Natal. Os médicos acharam perigosa, por ser mais embaixo, e já perto de voltar com o grupo tive uma recaída e tivemos que começar do zero. Por isso fizemos uma recuperação mais cautelosa (Filipe Luís teve uma lesão muscular na perna direita, no dia 17 de dezembro).

E seu futuro no clube? Você tem mais seis meses de contrato, pensa em renovar ou sair?
Meu contrato acaba em junho. Quando eu voltei do Chelsea, planejei me aposentar aqui. Eu tinha 30 anos, terminaria esse contrato com 33 para 34, renovaria por mais dois ou três anos e depois já ficaria trabalhando no Atlético. Perfeito para mim. Mas sabemos que no futebol as coisas podem mudar. O Atlético tem uma regra, entre aspas, de só renovar ano a ano com quem tem mais de 30 anos. Embora tenham contratado o Kalinic, de 31, por quatro anos, e assinado contratos mais longos comigo e Godín, quando tínhamos 30. Depende do momento. No fim do mercado, eles me prometeram, em frente ao grupo, que fariam um esforço e uma oferta de renovação. Tenho esperança que o Atlético ofereça um contrato de dois ou três anos para eu poder encerrar minha carreira aqui. Depende do clube.


"Tenho esperança que o Atlético ofereça um contrato de dois ou três anos para eu poder encerrar minha carreira aqui. Depende do clube."
Um novo contrato de apenas um ano não é interessante para você à essa altura?
É difícil competir com uma oferta de três anos. Se renovo ano a ano, fico sem saber se daqui a pouco terei que tirar meus filhos do colégio, ir para um lugar que não quero ou até largar o futebol.

E diante dessa possibilidade de sair do Atlético, o futebol brasileiro é uma opção de futuro?
Não fecho portas, mas minha prioridade é a Europa porque vivo aqui há 14 anos. Conheço as ligas, a Champions. E no futebol brasileiro não é fácil a pressão para quem está habituado à Europa. Agora, que jogador brasileiro não sonhou jogar no Flamengo, no Corinthians, no São Paulo? Eu era flamenguista de pequeno, hoje torço para o Figueirense, mas falo sempre com o Diego sobre como deve ser jogar lá. O Gabigol assinou agora e foram buscar no aeroporto. Quem não sonha com uma pressão boa? É que sabemos que aqui fora é mais seguro para o jogador, os contratos são cumpridos, é complicado ter estabilidade no Brasil.

Você disse que havia pensado em terminar no Atlético e continuar trabalhando no clube. Em que, especificamente? Quais os seus planos?
Quando acabar minha carreira eu quero trabalhar no futebol, no campo. Mesmo que eu seja um treinador horrível, vou tentar até o final (risos). Tenho alguns companheiros que se retiraram e me convidaram para trabalhar em suas comissões. Sempre sonhei estar nesses bastidores, como auxiliar e, quem sabe um dia, como técnico. Eu me sinto capaz e vou tentar. Outra coisa é depois conseguir gerenciar um grupo, ser um bom técnico, ser o Tite.

Tite é seu modelo?
Eu tenho um pouco de cada um. Trabalhei com Mourinho, Simeone, Quique Flores, que é um grande cara, Dunga. O Lotina, meu técnico no La Coruña, ensinou muito sobre coisas que viveu no futebol e me servem de lição. O que Tite traz é maravilhoso, e somado a coisas que vi de outros técnicos, será uma mistura boa. Além disso, é a filosofia que cada jogador tem do futebol, sobre o jogo. E convencer o jogador de que aquilo vai dar certo é o mais complicado. Só os grandes conseguem.

Hoje a carreira de treinador exige cursos, diplomas, está disposto a passar por essas etapas?
Para tirar as licenças da Uefa aqui na Espanha tenho que ficar três semanas num intensivo de oito horas por dia. Enquanto jogo não consigo, senão já estaria fazendo, aprendendo filosofias, treinamentos, maneiras de conversar em público, de lidar com situações complicadas. Quero fazer os da CBF também, tudo que tiver pela frente.

E você, apesar de ter trabalhado com treinadores tão diferentes e dizer ter aprendido um pouco com cada um, já tem uma filosofia sua de futebol, que pretende adotar como técnico?
Tenho. Cada um tem uma maneira de pensar o futebol, mas você depende totalmente dos jogadores. Não adianta eu querer fazer meu time jogar com zagueiros que não tenham bom pé. Podem ser bons na marcação, mas tentar sair jogando, perder a bola e tomar gols. O jogador vai parando de acreditar no que tu fala. A filosofia é fazer o melhor possível para ganhar jogos com os jogadores que eu tenho. Mas eu gosto de ter a bola, tocar, sair com bola no chão. Meu futebol sempre foi esse.

Um dos jogadores mais decisivos do mundo hoje é seu companheiro de clube. O que tem a dizer sobre Griezmann?
O Griezmann é um cara simples, que vive o futebol com alegria. O que mais admiro nele em campo é a maneira como ele finaliza e pensa no gol. Eu nunca imaginei chutar no gol, mas toco para ele do meu lado e ele chuta de 30 metros. A bola vai na trave, o goleiro defende, ele finaliza muito bem de qualquer lugar. Fora de campo, é carinhoso, brincalhão e vem crescendo muito. Ele transmite essa imagem do cara que quer chegar a ser o melhor do mundo. Ele é um cara querido, eu gosto muito de trabalhar com ele.


Agora sobre um rival. No ano passado, você disse não entender uma premiação sem a participação do Messi. Ele é o melhor do mundo na sua opinião?
Eu entro em campo para não deixar ele fazer nada. Seja o Messi ou qualquer outro. Mas, depois de tantos anos, você vê um cara que se reinventa, jogava na ponta, agora joga no meio. E, de repente, ouço que ele não merecia ganhar a Bola de Ouro por que fez uma temporada ruim em 2018. Ganhou a Liga, a Copa (do Rei), foi o cara que mais fez gols em toda a Europa e deu um monte de assistências. Ou quem fala isso não está vendo o que eu vejo ou eu não sei nada de futebol. Ele é o melhor do Barcelona, faz gols, quando não faz dá assistências ou começa as jogadas dos gols. Isso em todos os jogos por 10 anos. Minha rivalidade com ele é infinita dentro de campo, mas fora minha admiração também é infinita. Ele é argentino, joga num rival, não ganho nada falando bem dele. Mas é minha sinceridade. Eu quero que o Neymar ganhe porque é brasileiro, quero que o Griezmann ganhe porque é do meu time, mas isso é o que eu vejo e não tenho nenhum medo de falar a verdade.

"Minha rivalidade com Messi é infinita dentro de campo, mas fora minha admiração também é infinita. Ele é argentino, joga num rival, não ganho nada falando bem dele. Mas é minha sinceridade."

Você se diz um cara supercompetitivo, deve ser uma tortura esse momento de lesão, de limitação física. Como você passa por ele?
Eu falava disso hoje com meu fisioterapeuta. Vou ter muita dificuldade quando não puder mais fazer esporte. Eu jogo desde que me conheço como pessoa. Aos três anos ia à escolinha, treinava todos os dias, em casa jogava bola na parede, treinava tênis. Jogo vídeo game, baralho, dominó. O esporte é um vício para mim tão forte como deve ser o álcool. A lesão muscular é frustrante porque parece que teu corpo falhou. Os primeiros dias na academia são muito difíceis, se esticar a perna dói e estou machucando a lesão. É uma angústia. Quando começo a correr um pouquinho e sinto o ar na cara já sou mais feliz, outra pessoa. Quando eu tiver 70 anos não sei o que vou sentir. Gostaria de falar com quem passou por isso para me preparar (risos). Estou competindo há 33 anos, não vai ser fácil parar de jogar.

"O esporte é um vício para mim tão forte como deve ser o álcool."
Mas você tem muitos outros interesses além do futebol. É cinéfilo, joga xadrez, gosta de ler sobre o universo. Isso não ajuda?
Em 2010, quando eu vim para o Atlético, quis fazer Medicina. Meu sonho sempre foi ser médico, falei com o doutor, mas era impossível pela quantidade de horas. No Chelsea eu comecei a fazer cursos práticos de técnico, dando aulas para crianças. Tive a fase de tocar violão. Agora, mais velho, estou treinando meu filho para fazer dele um bom jogador (risos). E um exercício que estou fazendo é analisar jogos. Eu me encontro com o Tiago, português que jogou comigo no Atlético. Somos amigos e vemos os jogos encontrando erros, acertos, o que faríamos. Tentando já aprender.

Pretende levar adiante esse sonho de ser médico?
Não, decidi que vou continuar no futebol. Eu tenho três filhos e a faculdade de Medicina são seis anos, depois residência e especializações. Eu desisti desse sonho, mas amigos médicos já me deixaram ver cirurgias, coisas que gosto. Vi artroscopias, cirurgias de ombro, fraturas de clavícula. Só não posso operar (risos).

"Eu desisti desse sonho (de ser médico), mas amigos médicos já me deixaram ver cirurgias, coisas que gosto. Vi artroscopias, cirurgias de ombro, fraturas de clavícula. Só não posso operar (risos)."
Neste exato momento, acabando a entrevista, o que você vai fazer?
Agora vou pegar minhas crianças no colégio, faço tudo com elas. Jogo bola com meu filho, brinco de casinha com minha filha. Mas o que quero mudar em 2019 é ficar menos tempo no celular. São horas e horas no sofá. Quando virou o ano, à meia-noite, eu falei que não usaria mais em casa. Vou deixar na mesa e ver a vida pelos meus olhos, não por uma tela. Estou voltando a ler mais e largando esse vício.

Você acha que hoje o celular atrapalha o convívio numa equipe de futebol?
Concordo, tudo que é demais atrapalha. Nos concentramos muito, há muitas viagens, e usamos o celular quando estamos esperando o ônibus para ir ao aeroporto. Depois no caminho, na espera da sala de embarque, no avião que não decola. Antes era chato esperar, agora é legal porque estamos com o celular na mão, né? Comecei a reparar que à noite eu queria ver uma série, levava um livro, mas não via nem lia nada por causa do celular. E no dia seguinte me sentia mais desconcentrado, não conseguia prestar atenção nas palestras. Passei a achar que era culpa do celular. Você ficar duas horas passando de uma rede social para outra é jogar o tempo no lixo.

"Eu não conseguia prestar atenção nas palestras. Passei a achar que era culpa do celular. Você ficar duas horas passando de uma rede social para outra é jogar o tempo no lixo."
Você falou do Brasil como um possível destino profissional, mas e sobre ser um país para morar e criar seus filhos? Cogita esse retorno?
Minha esposa é espanhola, meu objetivo é ficar na Europa, mas estou abrindo um centro de alto rendimento em Jaraguá do Sul (cidade de Santa Catarina onde o lateral nasceu), parecido com o que há no tênis. Vamos pegar meninos que já tiveram algum talento detectado e potencializá-los, fazer com que sejam muito melhores. O Maneca é o técnico que me ensinou a driblar, tocar, gingar no futsal, todos os fundamentos. Tudo que ele me ensinou no salão, aos nove anos, é o que sou hoje. Ele é capaz de ensinar qualquer criança e vai trabalhar lá com outros técnicos. Depois vamos mandar para clubes com algum convênio. Meu objetivo é um centro de referência, onde tenham os melhores materiais, campos, e vivam dedicados ao futebol paralelamente aos estudos. Eu gosto muito de tênis e me inspirei em centros como o do (Rafael) Nadal. O objetivo é que esteja pronto já em julho, depois da Copa América, então ficarei muito entre Brasil e Europa daqui para frente.

E politicamente, você tem acompanhado o Brasil após a eleição de Jair Bolsonaro? O que pensa do momento do país?
Claro que eu acompanho. O Brasil é meu país, o país que eu amo. Para a população apostar na extrema direita é por que com certeza a coisa estava complicada. Eu não sou de extrema, gosto da normalidade, do diálogo. Mas se a população escolheu assim é por estar farta do que estava acontecendo. Só espero que o Brasil possa voltar a ter segurança, que tenha estabilidade. Não pode haver tanta miséria e diferenças. O brasileiro precisa ter o retorno dos impostos que paga, como eu tenho aqui na Espanha. Coloco meus filhos no ensino público sem qualquer problema, minha família tem atendimento maravilhoso em hospitais públicos, com os melhores médicos, as estradas são perfeitas. As pessoas no Brasil precisam ter esse retorno e a ambição de querer trabalhar, ajudar o próximo e fazer o país levantar. Precisamos também da atitude de cada um. Há muito trabalho pela frente.
 
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